Enquanto pragueja contra a vida e parece que chama à morte, de fato mostra que alguns pesos também trouxe a idade. Mas no fundo, o que quer é espantar pra longe o último respiro. Respira fundo. Bem fundo.
O cárcere televisivo já não mais o prende. Agora, precisa ver gente. Agora precisa ser ouvido. Agora precisa ser amado. O frescor da brisa matinal vai passando até que dê lugar ao sopro abafado da tarde, que por fim se recai avermelhado junto com o sol no horizonte. E ali passou-se o dia.
Do homem público que foi, preserva o dom da palavra. Cativa a todos porque domina a mensagem assim como um hábil artesão molda sua obra. Talvez esse carisma tenha facilitado a boêmia "don juanisse" dos tempos passados. Quantas delas já não cederam a um discurso do homem mais interessante do pedaço, o político, o contador, o atleta, o estudante, o jovem? Todas as facetas de um homem que não passou desapercebido em qualquer praça onde tenha pisado, em qualquer pista onde tenha saltado, enfim... Hoje em dia, um grande contador de histórias. Ou melhor, contador da História. A História que ele mesmo construiu
Pilar de uma família que, de tão única, parece igual a todas as outras. Mas não é. É única. Tem brigas como todas as outras, mas ainda assim é singular. Tipos de todas as gentes e gentes de todos os tipos, mas que têm todos algo em comum: aprenderam na cartilha do "homem". Embora alguns andem precisando voltar às aulas da cartilha, pois estão esquecendo de algumas lições primordiais: gratidão e respeito.
Mas esse homem não seria "um" se não existisse o resto da equação. Nesse caso, 1+1="1". O casal que sustentou o pilar desse seio familiar, ao somarem-se são iguais a "1". Um único ser. Uma única história. Um único destino. Compromisso selado perante Deus, que uniu dois, que somaram um, se multiplicaram em quatro, que daí multiplicaram-se dez (+1=11). E de toda essa matemática pra lá de complicada, já chegou Maria Vitória e João Pedro, e vem vindo aí o Gui.
Agora quero falar um pouco da outra metade dessa "unidade". A mulher. A mãe que tirou da boca o pão para que os filhos pudessem ter com que se alimentar. A avó que dispôs do seu tempo de mulher para criar os netos com todas - eu disse: todas! - as regalias possíveis, impondo limites quando se fazia necessário e paparicando quando as vezes nem se fazia tãão necessário. Coisas de vó... A mulher que sofre ao ver os filhos sofrerem parece que transplantou parte do seu coração pra dentro do peito de cada um de seus rebentos. Aquela que - quando a audição ainda não lhe faltava - acordava só de ouvir os passos das crianças no quarto. Parecia que dormia com um olho aberto, para vigiar o bem estar do netos. Aquela senhora que ainda faz a alegria dos filhos e netos, mesmo que agora isso tenha que ficar restrito a uma "ajudinha" financeira, pra comprar um cigarro ou pra se divertir com os amigos. Ela nunca falta.
É pena que as pessoas vão crescendo, crescendo. E também as pessoas vão diminuindo, diminuindo. Às vezes isso é invevitável. O contato já não é tão imediato quanto em épocas remotas em que apenas alguns quarteirões separavam as gerações. As farturas do domingo são cada vez menos freqüentes e cada vez menos vazias. Só não são mais tristes porque a Bêra "espuleta" nunca deixa a diversão acabar.
O homem, cada vez mais solitário em seu trono na varanda espera que seus filhos tirem pelo menos dez minutinhos de seus dias para ouvir uma de suas Histórias - mesmo que sejam as mesmas Histórias. A mulher, só quer alguém pra conversar ou pelo menos escutar, enquanto exercita sua Paciência. O casal sente falta dos seus frutos, que ao caírem do pé, foram levados pelo vento da vida adulta, embora de vez em quando eles ainda precisem retornar para descansar à sombra do leito de carinho que os pais oferecem em seus braços.
Aproveitando o texto, essa letra pode complementar o que eu estava querendo dizer:
O Velho e o Moço (Los Hermanos - Rodrigo Amarante)
Deixo tudo assim.
Não me importo em ver a idade em mim,
Ouço o que convém.
Eu gosto é do gasto.
Sei do incômodo e ela tem razão
Quando vem dizer que eu preciso sim
De todo o cuidado.
E se eu fosse o primeiro
A voltar pra mudar o que eu fiz.
Quem então agora eu seria?
Ahh tanto faz! E o que não foi não é,
Eu sei que ainda vou voltar... Mas, eu quem será?
Deixo tudo assim, não me acanho em ver
vaidade em mim.
Eu digo o que condiz.
Eu gosto é do estrago.
Sei do escândalo e eles têm razão.
Quando vem dizer que eu não sei medir,
nem tempo e nem medo.
E se eu for o primeiro
a prever e poder desistir do que for dar errado?
Ahhh, ora, se não sou eu quem mais vai decidir
o que é bom pra mim?
Dispenso a previsão.
Ahhh, se o que eu sou é também
o que eu escolhi ser aceito a condição.
Vou levando assim.
Que o acaso é amigo do meu coração
Quando falo comigo, quando eu sei ouvir...
"Respira fundo. Bem fundo"